Livro - Umidade
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O Liminha está se dando bem: já tem um Audi A4 e lábia suficiente para seduzir os clientes mais endinheirados. Quem ele não consegue seduzir é a Mariana, sucessivamente sua paquera, namorada, noiva e legítima esposa. Um mulherão, protegida com galhardia pela mãe, uma matrona portuguesa viúva do Homem de Vendas 1975 da Associação dos Revendedores Volkswagen. Liminha, o herói de "Umidade", conto que dá título ao primeiro livro de contos de Reinaldo Moraes, é um dos representantes mais precisos desta imensa colônia de bactérias que se reproduz sem cessar em meio úmido: a classe média. "O desejo cansa", pontifica Marcelo Mirisola na epígrafe do livro. Se é assim, os personagens desses contos - e, por tabela, todos nós - vivem exaustos, escravizados por um desejo insaciável e muitas vezes risível: o casal que lê na cama a bula do Viagra, tentando fazer um casamento de mais de vinte anos pegar no tranco; a esposa frustrada que deixa o marido em casa e se deslumbra num festim da alta burguesia; o cara que perde a namorada e acha uma carteira recheada de dinheiro no aeroporto de Paris; o mauricinho que tenta seduzir uma gata da Zona Norte de São Paulo; a instrumentadora cirúrgica que vê o fim de semana na praia ser destruído pelos caprichos do filho e a falta de imaginação do namorado. De um realismo escrachado ou abertamente paródicos, os personagens e situações de Umidade são o melhor exemplo do casamento entre humor e boa literatura. Não é todo dia que encontramos um autor refinado e galhofeiro como Reinaldo Moraes, capaz de encaixar os maiores desatinos na sintaxe dos grandes clássicos. Seu romance Tanto faz, cult nos anos 80, que conta a história do bolsista beatnik que vai para Paris fazer uma espécie de doutorado em hedonismo, é o grande retrato literário da abertura cultural que ocorreu no Brasil a partir de 79. Nos contos de Umidade é como se o bolsista tivesse envelhecido vinte anos e, em vez de sugar a vida nas veias de Paris, flagrasse-a pateticamente no apartamento do vizinho.

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